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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

TROCANDO O DUVIDOSO PELO CERTO. SONHO OU DESTINO? - Por Benjamin Collares


Olavo Leite Kafunga Bastos foi o maior goleiro da história do Clube Atlético Mineiro e o atleta que mais vestiu a camisa do clube, jogando no galo durante 20 anos, de 1935 a 1955.

Após encerrar a carreira se tornou comentarista esportivo e vereador em BH. Folclórico e engraçado criou expressões que ficaram na história do futebol e até hoje são repetidas e comentadas por aqueles que gostam do esporte: “não tem coré coré”, “cabeça de bagre”, “vapt vupt”, “gol barra limpa e gol barra suja”, “despingolar”, “tá no filó”; e quando queria mostrar que algo era muito velho dizia: “Isto é de mil novecentos e Kafunga”. Faleceu em 1991 e se tornou uma lenda do esporte mineiro.

A frase mais famosa do repertório de Kafunga foi dita em relação às coisas inexplicáveis e inacreditáveis que aconteciam e ainda continuam a acontecer em nosso país. Sabiamente, ao comentá-las, ele dizia: “No Brasil o errado é que está certo”.

Impressionante como ao longo da história, em diversas áreas e situações, das coisas mais simples às mais complexas, no individual e no coletivo, de qualquer forma e jeito, sempre que avaliamos o Brasil, acabamos confirmando a veracidade deste dito; descontando-se os poucos momentos de lucidez e acertos, que servem, justamente, para desmentir a regra e mostrar que, quando queremos, sabemos fazer direito.
No entanto, no geral, é impensável a forma como se resolvem as coisas neste país. Parece que fomos impregnados por um ranço cultural que nos leva sempre a complicar e a percorrer o caminho mais difícil. Com isto, deixamos passar grandes oportunidades de tornarmos protagonistas no mundo.

Virou rotina se dizer que o Brasil é assim mesmo, que não tem jeito, que pior do que tá não fica ou que aqui tudo é complicado. Isto, em parte, é verdade, mas demonstra um estado de conformação com a situação, que não combina com as nossas possibilidades e prognósticos.

Existem todas as condições, se quisermos, do Brasil deixar de dormir eternamente em berço esplêndido, de ser o eterno país do futuro e passar a perseguir com maior determinação o “até que enfim conseguimos” ao invés de ficar indefinidamente no “até quando”.

Talvez a idealização e implantação do Plano Real tenha sido o último grande momento de lucidez colocado em prática neste país, pois com competência e coragem foi enfrentado um problema de mais de 40 anos de inflação, que destruiu o poder de compra da população e, com o advento da correção monetária, contribuiu para um injusto e desigual quadro de distribuição de renda. A atitude tomada na época demonstrou maturidade e sabedoria para se buscar a solução óbvia e correta para solucionar o problema; abandonando de vez as estratégias mirabolantes, que se baseavam sempre na nossa falsa presunção de ser um povo diferente e mais esperto do que os outros.   

Por outro lado e infelizmente, a nossa vertente indolente e irresponsável acaba sobrepondo-se na maior parte das vezes: nos planos e políticas educacionais que nunca resolvem o problema e só atrasam o país; na eterna enrolação de que saúde e segurança são prioridades, mas nunca recebem as devidas contrapartidas financeiras, nem ações efetivas para melhorá-los; na justiça confusa e lenta, pelas nossas características de arrastar indefinidamente os problemas para instâncias superiores, procurando adiar ao máximo qualquer decisão; na exagerada maneira de vermos os nossos direitos de forma inversamente proporcional aos nossos deveres.

Na legislação complexa, que quase sempre já apresenta as leis com suas brechas e lacunas pra serem contestadas e dribladas; na convenção de que toda verba pública liberada precisa ter percentual de participação alheio; na legislação trabalhista que inibe a geração de empregos e incentiva a informalidade; na estrutura tributária que encarece a vida dos cidadãos; na falta de planejamento, que impossibilita trilharmos o caminho mais seguro, deixando-nos sempre pendurados em atalhos emergenciais e aos trancos e barrancos.

De acreditar que para se resolver qualquer problema, basta criar uma lei, um ministério ou uma secretaria sobre o assunto; no erro de se criar exceções às regras pra tudo, o que sempre encarece mais as coisas, pois no intuito de beneficiar idosos, estudantes, mulheres, policiais, pessoas de baixa renda, pessoas com necessidades especiais, etc, não pelo objetivo em si, que em muitas situações é louvável, acaba fazendo graça com o chapéu alheio, já que os custos pelas benesses oferecidas ficam sob a responsabilidade de quem oferta o serviço e não do governo; na criação, sem sentido, de novos municípios e estados, proliferando câmaras de vereadores, prefeituras, comarcas e por ai vai, que só geram custos e nenhum benefício; na ideologia idiota de que o Estado pode e deve fazer tudo e na insistência imbecil, apesar das evidências práticas, de que estatizar é melhor do que privatizar.

Como consequência, assistimos: a proliferação da pirataria generalizada, de inúmeras leis que não são cumpridas; de outras leis espertas que servem apenas para justificar e legalizar atitudes antiéticas; uma perigosa flexibilização da ética e dos bons costumes; a monetização das “boas intenções”; a desmoralização dos poderes constituídos, a degradação das instituições representativas da sociedade; o exagerado aumento da boca e da botija e o rebaixamento dos padrões morais.

Poderíamos continuar a listar indefinidamente a série de besteiras que assolam o país, mas pra relaxar, citaremos mais alguns inacreditáveis: como de uma operadora de telefonia que ao receber uma ligação de um parente de um cliente que havia falecido, procurando cancelar a linha telefônica dele, teve como resposta da atendente, que só o titular da conta poderia fazê-lo; outro, da justiça paulista que condenou um morador de rua à prisão domiciliar; a decisão recente, de que o crime da saidinha de banco passa a ser responsabilidade do banco e não do Estado, que é o responsável pela segurança pública; na lei da palmada, que proibiu aquilo que a maioria dos que a aprovaram mereciam, pra tomar jeito; em outra empresa de telefonia que ao cadastrar a informação de um roubo de celular e a solicitação de bloqueio da linha, informou ao cliente que o número do protocolo de atendimento seria enviado para o número do celular; a recente entrevista de uma funkeira a Luciana Gimenez, afirmando que no Brasil existe muito preconceito contra o racismo e o pitoresco caso do vereador que gastou grande parte de sua verba de representação no buffet da madrasta.      

A repetição destes desatinos e a alienação da maior parte da população, permitiu o estabelecimento de uma situação curiosa no país: o governo e o povo foram se distanciando e transformaram-se em duas entidades distintas e independentes, chegando mesmo, em algumas situações, a se tornarem antagônicas. Tanto que passou a ser comum um tratar mal o outro e o outro falar mal do um. Cargo eletivo virou emprego e todos os eleitos se acham no direito de reivindicar direitos como um trabalhador comum. Política virou meio de vida.

Assim, temos a curiosa situação da sociedade pagar cada vez mais impostos e taxas ao governo, para que este consiga cobrir os seus gastos e equilibrar as suas contas, sem que ela, (a sociedade), que é responsável pela eleição do “governo”, receba as devidas e merecidas contrapartidas em produtos e serviços de qualidade. Esta situação, de tanto se repetir, acabou virando fato comum e, depois, a regra. Assim os papéis foram definitivamente invertidos e o governo passou a ser o foco de atenção no lugar da população. Aquele que deveria ser o provedor e facilitador das coisas se tornou um pesado e caro fardo para a sociedade.

Os governos (federal, estaduais e municipais) se transformaram em monstros arrecadadores e em um saco sem fundo pra gastar dinheiro inutilmente, já que a maior parte dos recursos é destinada à manutenção da estrutura governamental e só a menor parte é que é aplicada no atendimento das demandas da sociedade, principalmente, saúde, educação, segurança, moradia e infra-estrutura. Nesta situação ridícula, fica parecendo que o que é público é o governo e não o povo.

Pra piorar a situação, com o passar do tempo, a máquina pública só aumenta de tamanho e fica cada vez mais ineficiente, conseguindo a proeza de não atender a contento a população e também não remunerar adequadamente a maioria de seus servidores. Estes insatisfeitos acabam piorando a qualidade do atendimento ao público. Alguém já parou pra pensar na insanidade desta situação?
As crises emergenciais que o país enfrenta com chuvas, queimadas, seca, etc, oriundas da falta de planejamento e investimentos públicos eficientes, são um exemplo claro desta realidade mórbida, pois, ano a ano, vai aumentando e acumulando o passivo de obras necessárias que deveriam ter sido feitas pelo Governo, que sem recursos suficientes, apenas cumpre tabela de mero executor de gambiarras e improvisos, que só maquiam a situação e postergam as soluções definitivas. Literalmente o país passou a viver de apagar incêndios, sem qualquer condição de agir preventivamente.

O interessante é que no discurso todos sabem o que é melhor e o que deve ser feito, mas a prática mostra a eterna natureza tupiniquim de empurrar com a barriga e deixar o ônus para o próximo.

Não se concebe mais, em pleno século 21, o país tentar ser bem administrado com 38 ministérios, trocentas assembléias legislativas, dutrocentas secretarias estaduais e municipais e putrocentas câmaras municipais, todas com um número exagerado de representantes, assessores e funcionários, que são administrados por políticos indicados pelos partidos aliados, que desconsideram qualquer critério de competência técnica na escolha de seus representantes, que só pensam em seus umbigos e proventos .  

Vivemos a estranha situação de um condomínio que cobra cada vez mais caro dos moradores para manter a boa vida do síndico e de alguns amigos e vive com recursos limitados pra pagar as contas de água, luz, impostos e taxas e sem nenhuma reserva financeira para atender qualquer necessidade extra. O pior é que o apetite do síndico e de seus amigos só aumenta.

A situação apresenta desdobramentos graves, porque a esculhambação da administração pública e ineficiência da justiça, dissemina o princípio da casa da mãe Joana, onde se acredita piamente que o dinheiro público não tem dono e por não ser de ninguém, pode ser usado pelos espertos da maneira que querem e podem.  

E tome este festival de desvios de verbas, propinas, obras superfaturadas, super salários, comissões extras, verbas de representação duvidosas, negociatas e negócios escusos, mutretas de toda ordem, participações especiais em obras e licitações, quase tudo sem investigação, e quando descoberto, sem a punição dos culpados e o ressarcimento dos recursos afanados.

Até quando vamos viver neste “vapt vupt” administrativo, onde, um bando de cabeças de bagre tomam decisões desastradas, não conseguem resolver nada direito, se acham acima da lei e nos custam os olhos e a vergonha da cara.

 Tá na hora de exigir reformas essenciais e urgentes: administrativa, tributária, política e da previdência social, que resolvam de vez os problemas e coloquem um basta nesta zona, para que tenhamos ordem e progresso de fato.

Além disto, uma ampla reforma do judiciário que dê agilidade à justiça, para que ela consiga, finalmente, punir os infratores, passar a régua no errado, fazer os acertos de contas necessários e enfrentar e limpar as barras sujas, doa a quem doer e sem coré coré.

Não da mais, ou tá no filó, ou este país despingola de vez. 

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